
Lívia Carvalho; Advogada; Professora Universitária; Especialista em Direito Público (Direito Constitucional, Administrativo e Tributário); Especialista em Direito das Mulheres com ênfase no enfrentamento da violência doméstica e familiar contra a mulher; Especialista em Direito de Família e Sucessões; e Especialista em advocacia contenciosa e direito imobiliário.
O que você pensa no momento em que falamos de abandono familiar? Em uma criança nas ruas sem amparo emocional e financeiro, com fome, com frio? Pode ser isso também, mas o contexto é muito mais profundo.
O abandono familiar é uma triste realidade e muito perturbadora que afeta inúmeras pessoas ao redor do mundo, mas vamos focar em contexto nacional. É um fenômeno complexo e multifacetado, com consequências devastadoras para aqueles que o vivenciam.
O abandono familiar pode ocorrer de várias maneiras, desde o abandono físico, emocional e até mesmo financeiro, quando tratamos de questões financeiras se for criança ou adolescente, temos o instituto da pensão alimentícia para diminuir as consequências, entretanto, esse abandono também pode ser evidenciado em idosos, conforme demonstra a nossa legislação civil:
Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.
§ 1o Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada.
§ 2o Os alimentos serão apenas os indispensáveis à subsistência, quando a situação de necessidade resultar de culpa de quem os pleiteia
Uma das formas mais visíveis de abandono familiar é quando um dos pais ou ambos decidem deixar seus filhos, sem assumir qualquer responsabilidade parental. O que pode acontecer por uma série de razões, como conflitos conjugais, problemas financeiros, vícios ou simplesmente falta de interesse ou comprometimento com a criação dos filhos (que é a mais
corriqueira), nesse caso, um dos genitores pode buscar o judiciário para regulamentar as visitas, por mais que afeto não deve ser algo obrigado, e também, a regulamentação das prestações à título de pensão alimentícia.
Independentemente das razões, que frisa-se, não há justificativa plausível, o resultado é que as crianças são deixadas em desamparo, muitas vezes tendo que enfrentar desafios emocionais e práticos sem o suporte adequado, afinal, venhamos e convenhamos terapia no Brasil é quase um luxo, que não são todas as famílias que possuem cacife para suportar
quinzenalmente ou mensalmente, quiçá, semanal.
Também pode ocorrer de forma emocional aquele que não deixa feridas aparentes aos olhos, onde os membros da família se sentem negligenciados, ignorados ou rejeitados, quando um dos pais está presente fisicamente, mas não está emocionalmente envolvido e participando, essa ausência de apoio emocional pode levar a problemas de autoestima, confiança e dificuldades nos relacionamentos interpessoais que acarretam exclusão, tristeza, falta de amigos etc, eu poderia citar dezenas de prejuízos.
Além disso, o abandono familiar pode de maneira financeira, quando os pais não fornecem o suporte financeiro necessário para o bem-estar e dignidade da família. Isso pode deixar os membros da família lutando para atender às necessidades básicas constitucionalmente exigidas em nossa carta magna, como alimentação, moradia, educação e cuidados médicos adequados. As consequências do abandono familiar são profundas e duradouras que não se extinguem sem tratamento adequado por profissional qualificado, sem o tratamento as feridas emocionais continuam ali, a consequência é uso de substâncias entorpecentes que trazem os sentimentos à tona ou a ingestão de bebida alcóolica que também faz renascer as dores que estavam “acomodadas”.
As pessoas que sentem na pele o abandono podem desenvolver sentimentos de tristeza, raiva, agressividade, solidão e rejeição, emoções que podem afetar a saúde mental e bem-estar geral, levando a problemas como depressão que é conhecida como o mal do século disputando com a ansiedade, baixa autoestima e comportamentos autodestrutivos que afastam as pessoas. O impacto pode ser ainda mais significativo quando falamos das crianças em lares desajustados, prejudicando seu senso de identidade, habilidades sociais e capacidade de formar relacionamentos saudáveis no futuro.
É importante frisar que o abandono familiar não é uma situação inevitável. Existem diversos recursos e apoio disponíveis para aqueles que estão enfrentando o problema em casa, existem organizações municipais principalmente que oferecem assistência para famílias em situações de crise, bem como acompanhamento psicológico gratuito. Além disso, é de suma
importância que a sociedade em geral tenha consciência do impacto do abandono e trabalhe para criar um ambiente onde a importância do vínculo familiar e do apoio emocional seja valorizada e que todos dentro do lar sejam ouvidos, que não desvalorizem a voz e a expressão da criança principalmente.
Portanto, é preciso combater essa realidade dentro de diversas famílias, oferecendo suporte, educação e recursos adequados, principalmente para as mães solo que arcam com toda a carga emocional sozinhas, somente com uma grande rede de apoio podemos ajudar a construir um futuro acolhedor para todos.
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